quarta-feira, 11 de novembro de 2009

"Liberdade: uma destas detestáveis palavras que tem mais valor que significado"


    Negros descem e sobem a montanha, carregam pedras e troncos. Do cume, após um dia de trabalho regado a suor e cansaço, almejam, com os olhos embotados de pôr-do-sol escondendo-se na unção entre oceano e horizonte, de meninos e meninas brincando pelas ruas de paralelepípedo, de senhores e senhoras rindo e bebendo vinho e de casinhas, construídas umas encostadas às outras, de tão felizes famílias livres, um dia, nem que seja nos fins de suas vidas, serem livres.

    Abraçado ao negrinho, o já velho, porém forte, negro, com os olhos tentados a transbordar desesperança, disfarça e tenta expressar um esboço de esperança.

    - Um dia o teu filho irá brincar de bola igual àquelas crianças, um dia beberás vinho com tua mulher e sorrirás alegremente.

    O negrinho, sabendo do esforço de seu avô em tentar poupá-lo, sorri dissimuladamente, tentando persuadi-lo que cria em tudo o que o mais velho contava. Era esperto o suficiente para perceber que aquelas estórias que escutava não passavam de estímulos enganosos com intuito de não permitir aos negrinhos perderem a vontade de viver.

    Mesmo sem vontade, e sem condições de atribuir sentido algum ao seu dia-a-dia, continuava a rotina, dia sobre dia subindo e descendo a montanha, carregando pedras e troncos, para construir sei-lá-o-que para sei-lá-quem.

    O agora não mais negrinho, no fim dos seus dias, encontra-se abraçado ao seu neto, após um longo dia de trabalho, no cume da montanha, observando o pôr-do-sol.



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